Para onde vai a história?
Neste XXXIII domingo, penúltimo do ano comum, somos convidados a refletir sobre um trecho do capítulo 13 do Evangelho de Marcos, que compõe o segundo e último discurso de Jesus transcrito por este evangelista (Mc 13, 24-32).
O discurso é apresentado em estilo apocalíptico. Hoje, muitas pessoas associam o termo “apocalipse” a catástrofes e destruições iminentes que ameaçam o mundo. No entanto, na tradição judaica, “apocalipse” (do grego: revelação) é um gênero literário que, de forma simbólica, busca oferecer esperança e orientar na superação das crises do presente. Vários textos do Novo Testamento utilizam esse estilo.
O contexto deste Evangelho é de conflito entre Jesus e as autoridades religiosas do templo de Jerusalém. Nos últimos dias antes de sua paixão, Jesus dirige-se ao Monte das Oliveiras, local que, segundo alguns textos proféticos, seria o ponto de partida para o reinado libertador do Messias.
O evangelista Marcos contrapõe o Monte das Oliveiras ao templo de Jerusalém. É nesse ambiente, em meio à natureza e distante dos santuários oficiais, que Jesus anuncia a vinda do Filho do Homem (odo Humano) sobre as nuvens do céu. Ele compara esse momento aos sinais de uma figueira que, ao dar frutos, anuncia a proximidade do verão. Por meio dessas imagens, Jesus ensina seus discípulos e discípulas a interpretar os acontecimentos da história com base no projeto de amor divino.
Na cultura da época de Jesus, era comum associar os impérios da terra aos astros do céu. Reis e rainhas eram representados como corpos celestes, tal como hoje se fala em “estrelas de cinema” ou “astros do esporte”. Isaías já havia escrito que, quando as luzes do céu fossem obscurecidas, os reis da terra seriam subjugados (cf. Is 24,22).
Por trás desse discurso de Jesus está a situação conflituosa das comunidades cristãs da década de 70. Essas comunidades vivenciavam os horrores da rebelião judaica contra Roma e estavam divididas entre a resistência e a colaboração com o movimento de libertação. Diante da destruição do templo e da opressão romana, muitos acreditavam que o fim do mundo havia chegado. Até hoje, há pessoas que, diante de tantos problemas atuais da sociedade, dizem: é o fim do mundo.
No contexto em que viveram as comunidades cristãs durante a guerra entre romanos e judeus, Marcos garante para Jesus isso que hoje se chama “lugar de fala”. No discurso, Jesus propõe aos discípulos e discípulas como interpretar a realidade. Ele as convoca ao discernimento: seria realmente o fim ou apenas mais uma crise a ser enfrentada? A mensagem é clara: vigiar e acordar! O objetivo é encorajar a resistência e ajudar as comunidades a superarem os desafios do presente.
Para os leitores de hoje, as imagens apocalípticas do colapso dos astros podem ser interpretadas como um chamado à desconstrução de sistemas opressivos. O “dogma do neoliberalismo”, que prega a inevitabilidade das desigualdades e a ausência de alternativas, precisa ser questionado. O Evangelho anuncia a ruptura dessa ordem que parece celeste e une terra e céu e a chegada de uma nova humanidade, simbolizada pelo Filho do Homem que aparece sobre as nuvens que reúne os eleitos de um extremo da terra a outro. Hoje, nós diríamos: organiza os movimentos sociais, as diversas iniciativas da sociedade humana e inaugura o novo de Deus nesta terra.
Para nós, cristãos e cristãs, Jesus ressuscitado é imagem desta nova humanidade. Ele encarna na sua pessoa este Filho do Homem que dá sentido à história e ao cosmos. Ele é a garantia de que a história tem sentido, a humanidade tem salvação e proclama que o amor triunfa sobre o desamor e a vida vence a morte.
A parábola da figueira, utilizada por Jesus, vem dos profetas e já havia aparecido em Marcos 11 como sinal do templo e de um Israel preso à lei. Lá, a figueira sem frutos que só dava folhas era um sinal de estagnação. Agora, porém, Jesus afirma que o surgimento de folhas indica a proximidade do verão de Deus. Assim, somos chamados a ler e interpretar os sinais dos tempos como indicadores da presença renovadora e do “verão de Deus na história”.
Desde 2017, o Papa Francisco instituiu o XXXIII Domingo Comum do ano (o penúltimo do ano litúrgico), como o Dia Mundial dos Pobres. Não se trata apenas de refletir sobre a pobreza, mas de intensificar gestos concretos de comunhão e partilha com as pessoas e as comunidades empobrecidas. A partir delas, a história pode se renovar, trazendo salvação para toda a humanidade e para a Mãe-Terra.
“Muito maior que a morte é a vida.
Um poeta sem orgulho é um homem de dores,
muito mais é de alegrias.
A seu cripto modo anuncia,
às vezes, quase inaudível,
em delicado código:
‘Cuidado, entre as gretas do muro
está nascendo a erva…’
Que a fonte da vida é Deus
há infinitas maneiras de entender.” (Adélia Prado)