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Reflexão do IV Domingo de Páscoa : Jo 10, 11- 18 (Ano B) por Ir. Marcelo Barros

Para as águas tranquilas nos conduz – Jo 10, 11- 18 (Ano B)

Esta palavra do Salmo 23 pode ser o horizonte da nossa meditação neste 4º Domingo da Páscoa, ocasião na qual lemos anualmente o capítulo 10 do quarto Evangelho de João. Neste ano B, temos como texto João 10, 11-18. É a segunda parte da alegoria que o evangelho situa como palavra que Jesus teria dito aos sacerdotes no Templo de Jerusalém, durante a Festa das Tendas.

Até hoje, no judaísmo, o Sucot é uma festa anual que recorda a peregrinação do povo hebreu pelo deserto. Mesmo em nossos dias, nos terrenos de suas casas, as famílias judaicas improvisam tendas para reavivar a esperança messiânica da libertação.

Segundo o evangelho de hoje, é nesse contexto de uma festa que lembra o nomadismo que Jesus se apresenta como pastor, uma figura nômade cuja função é conduzir as ovelhas para o pasto. O pastor as tira da segurança do curral, onde ficam protegidas durante a noite. No grego, o termo “redil” ou “pátio das ovelhas” (aulé) é o mesmo termo usado no capítulo 18 para falar do pátio da casa do sumo sacerdote, onde Pedro negou conhecer Jesus. É o mesmo termo usado para falar do pátio do Templo de Jerusalém. Portanto, nesse evangelho, essa imagem de tirar as ovelhas do aprisco parece aludir a libertá-las da prisão da instituição política e religiosa, que as aprisiona e as controla.

Na Bíblia, o termo “pastor” era usado para indicar o chefe político, o governante. Na época de Jesus, como o Império Romano oprimia economicamente o povo através do Templo, os sacerdotes de Jerusalém e os rabinos das sinagogas acumulavam as duas funções. Eram, ao mesmo tempo, líderes religiosos e políticos, submissos ao império. Então, Jesus os confronta diretamente ao se colocar como único pastor que tem direito a entrar no pátio das ovelhas. O adjetivo usado para descrever o Pastor como bom ou verdadeiro (kalos) é o mesmo que o evangelho usa para o vinho melhor em Caná. O Cristo ressuscitado é o melhor pastor.

Hoje vivemos em um mundo urbano e não temos mais a experiência rural de pastor e ovelhas. Além disso, ninguém quer se colocar como ovelha de ninguém. A palavra “carneirada” tem uma conotação negativa. Nossa fé deve ser lúcida e crítica. De todo modo, o que a figura do pastor nos diz é que Jesus se coloca como nosso guia e cuidador, guardião de nossas vidas. Nessa alegoria, Jesus contrapõe duas figuras: a do pastor e a do funcionário (mercenário). Em nossos dias, tanto na política quanto no âmbito da fé, conhecemos as duas figuras. Há pessoas que exercem uma política como arte de cuidar do bem comum e há aquelas que se comportam como funcionários que querem apenas ganhar dinheiro e levar uma vida fácil. No campo religioso, conhecemos pastores verdadeiros que cuidam do povo e testemunhamos o amor divino, assim como conhecemos funcionários que se encastelam na instituição em busca de poder, prestígio e dinheiro. Estes usam Deus como uma arma para baquetear e explorar as ovelhas e não para dar vida.

Esta parábola do pastor nos lembra a lamentação do Salmo 80 que chama Deus de Pastor de Israel, mas diz que o povo é saqueado e a vida tem sido destruída. Este capítulo 10 do quarto Evangelho é uma das passagens bíblicas mais duras e críticas em relação aos governantes e poderosos do mundo. Sem fazer nuances, diz que todos os governantes de Israel antes de Jesus foram bandidos e salteadores que entraram no aprisco não pela porta normal, mas pelas janelas da exploração da ignorância de muitas pessoas e do poder do dinheiro. E Jesus se coloca como um pastor contrário aos grupos religiosos que, indiferentes ao mundo dos pobres, pensam apenas em seus próprios interesses e, no caso dos grupos católicos, vivem fechados na idolatria do poder divinizado e do Deus da lei a qual obedecem. Jesus veio justamente para trazer vida no próprio reinado da morte.

Na realidade em que vivemos hoje, este evangelho nos convida a acolher o chamado de Jesus para um maior nomadismo espiritual.

Nos dias de hoje, a vida plena que Jesus afirmou ter vindo trazer (versículo 10) se concretiza como paradigma para toda a humanidade no Bem-viver. Isso significa lutar pelos bens comuns da humanidade e fortalecer a esperança de tempos novos. Para retomar as imagens deste evangelho, precisamos retomar a esperança de uma terra partilhada, da natureza respeitada e de uma política participativa. As pastagens de águas límpidas e transparentes para onde o Pastor promete nos conduzir são uma nova primavera do mundo e da vida. Ele veio realizar o que dizia o poema do Cântico dos Cânticos: “Vem, minha amada. O inverno já passou. As flores já nascem nos campos, a rolinha está cantando. É tempo de amar” (Ct 2, 11-13).

SOU BOM PASTOR, OVELHAS GUARDAREI:

NÃO TENHO OUTRO OFÍCIO NEM TEREI.

QUANTAS VIDAS EU TIVER EU LHES DAREI!

1 – MAUS PASTORES NUM DIA DE SOMBRA,

NÃO CUIDARAM E O REBANHO SE PERDEU.

VOU SAIR PELO CAMPO, REUNIR O QUE É MEU,

CONDUZIR E SALVAR

(Waldecir Farias)

Ir. Marcelo Barros